Partiu o homem que fez da Garagem Aurora um marco incontornável na história do Automobilismo.
Num fim-de-semana que não foi de corridas, como ele teve às centenas, partiu Mestre Eduardo, o homem que fez da Garagem Aurora um marco incontornável na história do Automobilismo. Deixa-nos memórias únicas e um legado que terá continuidade na sua Garagem Aurora.
Nascido no Porto a 8 de Agosto de 1938, Eduardo Santos cedo manifestou as qualidades que manteve até ao fim dos seus dias: a inteligência e a vontade de trabalhar.
Começando muito jovem, como aprendiz – fazendo ao mesmo tempo os seus estudos na Escola Infante D. Henrique – na Garagem Aurora, que havia sido fundada por Manuel António Alves, viria a assumir totalmente os destinos da oficina quando contava 25 anos.
Compatibilizando o serviço “normal” de uma oficina com o apoio a alguns clientes nas corridas, o envolvimento de Mestre Eduardo com a competição começou a destacar-se na ligação a Manuel Nogueira Pinto, piloto que se viria a fazer notado ao volante de um Porsche 911R e de um Olympic, de Fórmula V.
Seria nesta última fórmula que o espírito criativo de Eduardo Santos se começaria a revelar, quando empreendeu a construção dos seus próprios monolugares, os Aurora V.
Mais ou menos pela mesma altura, aquando da aquisição do Porsche 911 R de Manuel Nogueira Pinto, Eduardo Santos deslocou-se à Alemanha, onde veio a efectuar o seu primeiro estágio na Porsche, marca à qual ficaria para sempre ligado, graças aos excelentes resultados que proporcionou aos pilotos que utilizaram as máquinas germânicas.
O envolvimento com as máquinas de Estugarda teve continuidade com a assistência prestada aos, entretanto aparecidos, Carrera 6, conduzido por Nogueira Pinto ou Carlos Santos.
Seria ainda com base num Porsche Carrera 6 (ou 906) que Mestre Eduardo viria a construir o Aurora-Porsche Spyder, por si concebido e estreado em 1973, tendo como piloto Robert Giannone.
Mais tarde, mas ainda na década de 70, com a estrada em vigor de novos regulamentos, a nível internacional e nacional, a aposta dos interessados em triunfar nas corridas principais virou-se para os Grupo 5, traduzida em Portugal no Agrupamento B.
Na Aurora criou-se então o Porsche Aurora RSR, equipado com um motor 2.8, que debitava 280 cavalos. Para o conduzir Eduardo Santos teria um piloto que muito admirava e que viria a desaparecer precocemente, Clemente Ribeiro da Silva, que Eduardo Santos já tinha apoiado, quando o piloto se sagrou campeão nacional de Turismo de Série (em 1975), ao volante de um Opel Commodore GS/E.
Com o desaparecimento de Ribeiro da Silva, Mestre Eduardo encontrou em Joaquim Moutinho um piloto à altura de dar continuidade ao desenvolvimento do RSR.
António Barros e Rufino Fontes foram outros dos pilotos que conduziram aos triunfos os RSR da Aurora, ainda antes de um dos dias mais trágicos na vida de Eduardo Santos. Na realidade, a 16 de Julho de 1981, um incêndio destruiu por completo as instalações (e muitos dos automóveis que ali se encontravam) da Garagem Aurora na Rua de Côrte Real.
A tragédia abalaria seriamente Eduardo Santos, mas não o derrubou. A cerca de 100 metro da oficina original, a Rua de Diu foi encontrada uma solução provisória (que viria a ser definitiva por 27 anos), onde o génio e o trabalho do Mestre teve continuidade.
Em resultado de novas alterações aos regulamentos, o panorama automobilístico português voltou a mudar em 1982. A Aurora também se veio a envolver no desenvolvimento de novos carros – nomeadamente no Porsche de Carlos Rodrigues –, mas por esse dias a aposta era na diversificação.
Na década de 80 são imensos os pilotos que "passam pelas mãos" de Mestre Eduardo, com o envolvimento da Garagem, também, nos troféus monomarca que então proliferaram – Toyota Corolla GT, Renault 5 GT Turbo, etc.
Pela Garagem continuaram a passar automóveis de várias marcas – como, por exemplo, os Ford Sierra RS 500 –, que de lá saiam, graças às mãos do Mestre, mais competitivos do que quando lá chegavam.
Depois, o aparecimento das competições com automóveis Clássicos veio reforçar a presença da Garagem Aurora nas pistas.
Novamente com o Porsche 911 RSR, pilotos como Carlos Rodrigues, António Barros (Filho), Carlos Filipe Santos, Kiko Mora e João Macedo Silva completam um quase infindável rol de nomes que deram títulos à Garagem Aurora.
Em 2008 a Garagem mudou de instalações, deslocando-se para a Zona Industrial do Porto, onde ainda hoje se encontra. É também nesse mesmo ano, que Eduardo Santos recebe na empresa a colaboração do seu filho, Eduardo Santos Jr., que em muito vem a contribuir para que a fama da Garagem e o saber do Mestre venham a ultrapassar fronteiras, em especial em direcção a Espanha, onde a Aurora ajudou a conquistar diversos títulos.
Até ao fim dos seus dias, Eduardo Santos manteve sempre a sua paixão pela mecânica apenas não indo à Garagem por motivos de saúde. E, sempre que podia, não deixava fugir a oportunidade de emprestar o seu saber nas boxes de um qualquer circuito.
Felizmente, viu os seus méritos reconhecido em vida – com várias homenagens e com a publicação da sua biografia – e testemunhou que o legado da Garagem Aurora ficava em boas mãos.
À família enlutada, em especial ao seu filho e filhas, apresentamos as nossas condolências.
Foto: Rui Correia
NDR – Com a excepção que se impõe, à regra deste ser apenas um espaço noticioso, fica uma nota pessoal.
Conheci o Senhor Eduardo nas instalações da Garagem Aurora ainda na Rua de Diu e nunca mais me esqueci desse dia, em que estava longe de imaginar o convívio que viríamos a ter nas décadas seguintes.
Nesse primeiro contacto, ele de poucas falas, mas com as palavras certas, nasceu o que sei ter sido uma Amizade, que ainda hoje pergunto o que terei feito para a merecer.
Tive a honra de escrever a sua biografia, onde procurei transcrever o que me contou e que era relevante para a História.
O resto (e foi muito…) do que me transmitiu este Homem Bom, que agora partiu, guardarei até ao fim dos meus dias.
Até sempre Mestre.
Fernando DaSilva
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